postado por Alexandre Figueiredo
Linhaça Atômica
No começo deste ano, um sisudo economista, de seus 62 anos, se separou de uma conhecida e belíssima jornalista de televisão. Os motivos da separação não foram anunciados para preservar a privacidade do ex-casal, mas observa-se que são as tais “diferenças irreconciliáveis”, que seriam assumidas se a separação tivesse envolvido um casal dos EUA.
Nunca ficou difícil para executivos, profissionais liberais e empresários que começam a viver os 60 anos de idade viverem como os antigos “coroas” que eles conheceram e admiraram nos anos 1970. Era o estilo de vida ao mesmo tempo granfino, pedante e “comedido” dos senhores de idade que viraram seus “heróis” desde a tenra infância nos anos 1950.
Há poucos anos atrás, era a vez de um empresário e publicitário se separar de uma apresentadora de TV, por “diferenças irreconciliáveis”. E outro empresário, marido de uma atriz, só pôde manter o casamento depois de uma terapia de casal que fizesse pelo menos o homem aderir aos novos tempos.
Ficar trancado em escritórios ou consultórios fez com que uma geração de médicos, advogados, empresários, economistas e engenheiros nascidos entre 1950 e 1955 ficassem parados no tempo e vendo o mundo praticamente sob os olhos de seus pais, patrões e professores cerca de 20 anos mais velhos.
Presos a um padrão de comportamento e vestuário que os fazia “colarem” sapatos de verniz nos seus pés – só passaram a usar tênis nas caminhadas na orla sob pesados conselhos ortopédicos – e a se vestir de “industriais” ou “ministros” só para divulgar romances literários no Programa do Jô, os “granfinos” born in the 50s, sessentões de primeira viagem, mostram dificuldades de se reinventarem na vida.
Eu me lembrava de quando, por volta de 1974, eu via os noticiários da televisão, menino de três anos que eu era, e eu comentava que os homens que apareciam nas notícias vestindo terno e gravata estavam “vestidos de ministro”. Em 1978, eu já questionava esse “mundo adulto” em que homens se autoafirmavam com ternos, sapatos de verniz, cargos de comando e regras de etiqueta.
Esses granfinos trancados em escritórios e consultórios acham que só por ter um bom desempenho profissional (nada revolucionário nem idealista, diga-se de passagem), podem ao mesmo tempo terem moças bonitas mais jovens e terem uma personalidade mais antiga, que os fazia chegar aos 50 e, agora, aos 60 anos, com o desejo infantil de apressar uma bagagem mental de 70, 80 anos.
Procurando nas mocinhas uma tradução meio pós-moderna das “Garotas do Alceu”, série que mostrava a realidade de jovens moças sob desenho de Alceu Penna e outros autores (eu costumava ler, nas bibliotecas, os textos escritos por Maria Luíza Castelo Branco), os equivalentes brasileiros do Papai Sabe Tudo não acompanharam a transformação dos tempos.
Vendo com preconceito as transformações dos anos 80 fora de seus cursos de pós-graduação, de suas empresas e consultórios, como se não houvesse diferença entre Legião Urbana e Trem da Alegria ou entre Marcelo Rubens Paiva e o palhaço Bozo, eles compensaram, a partir dos anos 90, com suas esposas mais jovens, a imagem imatura causada em relações conjugais anteriores.
Eles pegaram mocinhas que viam MTV, que iam a danceterias e que hoje estão na casa dos 40, 45 anos, mas ficaram presos a um perfil de “coroa” ao mesmo tempo paternal, obsessivamente elegante, extremamente formal, não raro plagiando as personalidades dos patrões, professores e dos próprios genitores masculinos que lhes serviam de modelo para a vida.
“Mauricinhos” nos anos 70 que foram o auge do colunismo de Imbrahim Sued, depois convertidos em yuppies profissionalmente corretos, eles, já no final dos anos 1990, se impressionaram demais com seus cabelos grisalhos e entraram no século seguinte prometendo chegar aos 60 anos com uma bagagem mental de homens bem mais velhos.
E aí, ficava aquela coisa constrangedora de reviver o passado sem ter identificação natural com ele. Poucos conseguem enxergar o mundo para antes de seus berços, e os granfinos nascidos nos anos 1950 tiveram a mania de entender o mundo girado até o tempo de suas infâncias (mais ou menos 1958 ou 1959) como se eles tivessem sido adultos nessas épocas.
Aí vi, na edição recente de Caras, um médico de seus 60 e tantos anos aparecendo com traje de gala no baile do Copacabana Palace, alheio ao mundo ao lado de sua esposa 20 anos mais jovem, sem saber que o próprio baile já começa a sofrer as influências popularescas que fizeram esses sugar daddies se afastarem da revista Caras.
Independente de tais relações conjugais permanecerem ou não, o que se nota é que fica muito difícil esses médicos, empresários, advogados, economistas e engenheiros que têm 60, 65 anos, com cabelos grisalhos, experiência profissional, primeiros netos e tudo, viverem como os “coroas” de outros tempos.
Daí que, num dado momento, o Papai Sabe Tudo perde de vista a “Garota do Alceu”. Ironicamente, Robert Young, ator da série norte-americana (Father Knows Best, no original) encerrou sua carreira nos mesmos anos 80 desdenhados pelos granfinos de 60 anos.
http://linhacaatomica.blogspot.com/2015/02/papai-sabe-tudo-perdeu-de-vista-garota.html