Por Lucia Helena Monteiro Machado
Ah! As garotas do Alceu! Lindas graciosas, sempre sorridentes e sonhadoras. Quais sonhos eram apropriados para as jovens daquela época? Uma época que já se foi e não existe mais.
Estamos falando da década de 50. O Rio, capital do Brasil vivia sua “belle époque” tupiniquim. A vida era risonha e franca. Nada de violência, nem drogas, nem traficantes. Juscelino prometia 50 anos em cinco. O “presidente bossa nova” era chamado de “pé de valsa, pois gostava de dançar e dançava bem. Marta Rocha “quase” levava o título de Miss Universo. E, felizes, iam todos para a praia, como naquele filme famoso, Nunca aos domingos. Nesta não haviam arrastões…
Bem, e as garotas? Quanta graça e quanto charme exibiam as jovens cariocas! Admiradas e copiadas por todas as moças provincianas do país. E quem as traduzia de maneira perfeita? Alceu Penna. No seu traço inconfundível, estampava todo o charme da mulher carioca. E era uma via de mão dupla. Ele as retratava e elas o copiavam. Sem ser um “estilista”, coisa que nem existia na época, ele desenhava roupas, chapéus, fantasias de carnaval, maiôs e penteados que eram copiados por todo o Brasil. Falo de cátedra porque tive vestidos copiados de seus desenhos.
Belo Horizonte, uma cidade ainda acanhada, não tinha lojas de roupas femininas, muito menos butiques. As roupas eram confeccionadas por costureiras ou pelas próprias mães, como era o meu caso. E os modelos de Alceu eram um achado. A primeira loja de roupas prontas de Belô foi A Siberia, e os modelos vendidos eram mais estilo “senhora”. As jovens tinham que comprar pano nas várias lojas de tecido da cidade, para confeccionar seus modelitos. Enorme sucesso fazia a fábrica da Bangu, que tinha bonitos tecidos, em algodão da melhor qualidade. Era o pano perfeito para os modelos de Alceu. Então, os famosos “imprimes”, algodão estampado, floridos, perfeitos para as jovens.
Nessa época, nenhuma garota ia a uma festa junina sem uma roupa de chita. E os modelos vinham todos de Alceu. Como as festas eram bonitas e coloridas! Éramos orgulhosas de usar aqueles vestidos cheios de babados, fazer uma trança, ou colocar uma postiça, e dançar músicas tradicionais a noite toda. Nas festas típicas da Europa, toda a população se veste de maneira tradicional. Aqui, parecem ter vergonha. Hoje, as festas juninas são um amontoado de gente sem nenhum caráter, dançando músicas estrangeiras.
E os calendários do Alceu? Eram lindos. E apesar de ter aquele toque de ingenuidade, que ele colocava nas suas meninas, tinha uma enorme sensualidade. Sim, as garotas eram ingênuas, mas, de maneira nenhuma, assexuadas. As pernas esguias, que saíam de uma beca de formatura, o decote apenas sugerido e o olhar provocante, não deixavam dúvidas: eram sedutoras, provocadoras e, o toque de ingenuidade era apenas um charme a mais. Falando francamente, eram mais sensuais do que as modelos nuas dos atuais calendários.
Assim era Alceu. Um esplêndido desenhista, um refinado estilista e o melhor tradutor de uma juventude que reinava numa época que não volta mais, da que já foi chamada de “a era da inocência”. Não tão inocente assim, mas bem mais tranquila e segura. Mais charmosa também, em grande parte, graças a Alceu.
*Lucia Helena Monteiro Machado é psicóloga e escritora, autora dos livros Retratos em busca de uma história e Paris para brasileiros.