Por Anna Marina*
Família com muitas filhas moças só podia dar no que deu: como eram bonitas e muito vaidosas, chamavam a atenção na cidade. E, na época, pelo jeito que se vestiam, eram comparadas às Garotas de Alceu. Aquelas que, toda semana, traziam nas páginas de O Cruzeiro, a revista de maior tiragem da América Latina, todo o charme e o dengo das cariocas – muitos anos luz à frente das mocinhas do país.
Alceu Penna derrubava mitos, tabus, tradições, colocava na boca de suas garotas palavras e desejos que passavam longe do conservadorismo do país. Mesmo assim, não escandalizava, não era demonizado. Apenas copiado, e muito, por toda mocinha que queria ter o mesmo charme, as mesmas pernas longas, a mesma cintura fina daquelas imagens tão inovadoras e avant garde que a revista publicava.
O desenhista ia além de criar figurinhas: ditava moda, comportamento, vaidades. Nascido na pacata Curvelo, antecedia outra patrícia que anos mais tarde também fez história no país e no exterior. Só que Zuzu Angel tinha uma abertura diferente em relação à moda, sem muita criatividade por aqui. Criava sua própria visão do que acreditava ser o espirito do estilo brasileiro. Alceu Penna ia além: desenhando numa época em que as novidades lançadas no exterior levavam semanas para chegar aqui, aproveitava sua facilidade de receber informações antecipadas, por meio da revista, sabia antes das ávidas consumidoras para onde a moda estava indo.
Mas não ficava só nisso: assim como definia em seus desenhos as linhas criadas por Dior ou Givenchy, investia lindamente em tradições brasileiras, como as festas juninas e os bailes de carnaval. Aqui em Minas, não foram poucas as foliões que apareciam nos bailes chiques da cidade usando suas fantasias. E as festas juninas repetiam suas lindas roupas de sinhazinha.
Bom de tudo isso é que as criações de Alceu Penna eram replicadas em várias versões. Como as costureiras eram poucas, os modelos eram repetidos em máquinas de costura domésticas, por mães prendadas ou pela próprias garotas. Outro lance muito importante é que as lojas de tecido ofereciam mil opções, dos exclusivos tecidos importados aos nobres algodões nacionais. Até a Bangu entrou na dança, com os desfiles que promovida no país – e até no exterior – com modelos criados por Alceu.
Esse talento e esse bom gosto se repetiram depois nas páginas de culinária da revista, que eram editadas por sua irmã, Thereza de Paula Penna. Ele colaborava na montagem dos pratos, fazendo com que qualquer comidinha doméstica se transformasse em tentação gourmet. Outro setor, aliás, que a dupla de Curvelo investia em divulgação de um assunto que pouco aparecia nas páginas das publicações nacionais.
E o talento do estilista mineiro é tão autêntico que segue sempre atual. Os modelos que criava para suas garotas podem ser copiados hoje com o mesmo sucesso. Obra de mestre não envelhece, não faz 100 anos.
*Editora Anna Marina Siqueira, Caderno Feminino & Masculino / Jornal Estado de Minas.