Carmen Miranda e Alceu Penna  Um pouco de história da moda brasileira

 
A exposição “Carmen Miranda para Sempre” trouxe ao Memorial da América Latina em São Paulo a história da brasileira mais famosa do século XX, em fotos, discos, objetos e claro, roupas. Sem seus figurinos Carmen não alcançaria tanta notoriedade e por isso uma ala da exposição é dedicada a sua moda tão característica. A mostra estreou no Rio de Janeiro concomitantemente ao lançamento do livro de Ruy Castro.

Carmen Miranda é uma peça-chave na construção da imagem de moda que o Brasil tem no exterior. Em função de sua fama extrema ela criou uma personagem colorida e alegre, que se transformou no sinônimo de brasilidade. Hoje alguns criadores nacionais têm espaço lá fora, contudo, o caráter folclórico gerado pela estrela não foi totalmente substituído. Sua figura é fascinante e está intrínseca no imaginário mundial, por isso não é raro algum estilista revisita-la.

Dentro do espaço dedicado à moda na exposição estavam looks da Salinas, Sta. Ephigênia, Carlos Tufesson e Napoleão Lacerda. Marcas atuais que se inspiraram na artista para criar suas coleções.

A relação da diva com a costura começou cedo. Aos 16 anos aprendeu o oficio quando trabalhou na loja La Femme Chic. Com Madame Boss aprendeu a fazer chapéus, roupas e a cuidar melhor de sua aparência. Logo se tornou uma exímia costureira e, segundo sua recente biografia, ela mesma confeccionava seus figurinos. Em 1933, ela lançou a moda dos casaquinhos masculinos. No ano seguinte, um sapateiro do Catete fez, a seu pedido, os primeiros sapatos plataforma da história. Ela tinha o seios fartos e usava sutiãs que os achatavam.

O traje que a imortalizou foi o de baiana usado em “Banana da Terra” de 1938 – que não deixava ver um umbigo. Dorival Caymi além de compor a música “O Que a Baiana Tem”, assessorou Carmem a compor a fantasia repleta de balangandãs, todos muito bem descritos na letra e tudo isso por cinco dólares – pagos à vista.

Até Carmen Miranda, a fantasia de baiana não era bem vista nos bailes de carnaval porque poderia ser feita de chita e como o Brasil copiava a França, era vista como coisa de ralé.

As roupas que a cantora usava eram pesadíssimas. A saia que usou no filme “Copacabana” foi o Record: pesava 12 quilos. Uma curiosidade: Carmen foi uma das primeiras mulheres a fazer uma cirurgia plástica estética no Brasil. Ela operou o nariz, mas não gostou do resultado.

***
Alceu Penna?
Ano passado li o livro “Alceu Penna e as Garotas do Brasil”, publicado em 2004 pelo jornalista Gonçalo Júnior. O título é a biografia do célebre ilustrador da revista “O Cruzeiro”. Uma dúvida surgiu quando entrei em contato com a recente obra de Ruy Castro e vi a exposição sobre a biografada. O desenhista pouco aparece na primeira e não recebe citação na segunda. Contudo, no texto de Gonçalo, Carmen merece um capítulo especial.

Segundo relata o autor, a estrela e o ilustrador ficaram amicíssimos durante uma temporada de ambos nos Estados Unidos. Alceu serviu de intérprete para Carmen e sua banda, o Bando da Lua, além de contribuir com idéias para renovar sua imagem:

“O desenhista faz também uma série de sugestões para ‘renovar’ o guarda roupa da cantora. Adiciona ‘inclusive saias multicolores, os turbantes fantásticos e os sapatões de solas grossas. Desenhei também as suas fantasias quando ela foi para holywood com o Bando da Lua’. Cabe a ele também estabelecer para com os músicos uma mistura no mínimo exótica de fantasia: calça de smoking com sapatos e camisas listradas – então típica dos cubanos. Na cabeça, usariam chapéu panamá. Carmen deve a Alceu também o movimento que se torna uma de suas marcas registradas: o gesto de fazer ondas pela ponta da saia com o braço”. (pág. 68)

Contudo, a amizade de Carmen e Alceu foi breve, mortalmente abalada por uma reportagem publicada por David Nasser, um desafeto da artista. O jornalista divulgou uma biografia, revelando inclusive que a cantora nascera em Portugal Tudo isso de birra por ela ter gravado apenas uma canção de sua autoria e dado preferência para outros compositores, conforme relata Gonçalo Júnior. A estrela cedeu algumas fotos pessoas para Alceu, e essas fotos foram parar nas mãos de Nasser que as publicou maldosamente na revista “O Cruzeiro”. O livro conta que essa briga afetou profundamente o ilustrador – “Até o fim da vida, Alceu dirá aos seus amigos que esse é seu grande pesar”.

Penna assinou durante 26 anos (1938 e 1964) uma coluna que impulsionou as vendas de “O Cruzeiro”. “As garotas do Alceu” como ficou conhecida, eram desenhos de mocinhas bonitas, de corpos bem delineados, valorizados por um traço firme, aliado a cores alegres. A inspiração vinha das pin-ups americanas e seriam como modelo de beleza para as leitoras do semanário.

Foi pelo sucesso de suas meninas que o ilustrador assumiu a editoria de moda da revista nos anos da segunda guerra, em que a informação vinda da Europa, principalmente de Paris, demorava a chegar. A medida foi emergencial, porém, mostrou-se eficaz. O ilustrador passou uma temporada na Cidade Luz, e com a experiência adquirida desenvolveu figurinos para teatro e concurso de Miss. Também criou para Rhodia, que chamava nomes importantes das artes para estampar seus tecidos. Assim, Alceu Penna está entre os grandes criadores de moda brasileiros. E mesmo a dúvida se desenhou ou não para Carmen não tira a importância de sua obra para história da moda brasileira.

***
“O Cruzeiro”
A revista o Cruzeiro foi fundada em 1928. Era um dos produtos da empresa Diários Associados do magnata da comunicação Assis Chateaubriand. Foi um grande sucesso editorial. Sua maior tiragem foi de 720 mil exemplares, na edição que cobriu a morte de Getúlio Vargas. A revista acabou em 1975 em função do avanço da televisão e de revistas semelhantes, como a “Manchete”.

O Cruzeiro já está disponível na Internet.
http://www.memoriaviva.digi.com.br/ocruzeiro/ 

É incrível ver a moda e os costumes da época. Clique e verá “As garotas do Alceu” e Carmen Miranda encaixados no seu tempo.

***
Legenda das fotos – de cima para baixo:
1 – Capa do livro “Carmen” de Ruy Castro – Submarino
2 – Desfile Salinas/ Verão 2006 – Terra Moda
3 – Cartaz do filme “Banana da Terra” – Museu Virtual Carmen Miranda
4 – As arotas do Alceu – Moda Brasil (nesse link tem fotos e outras ilustrações do estilista)
5 – Estampas de José Carlos Marques e Thomoshigue Kusuno, estilista Alceu Penna, Coleção da Rhodia dos anos 1960 – CosacNaify

O Estilista Alceu Penna: O Descobridor da Mulher Moderna Brasileira

 

(DÉCADAS DE 40 E 50)

 

clip_image002

Figurino inspirado na ópera Carmem de Bizet (Alceu Penna)

Alceu Penna nasceu no dia 10 de janeiro de 1915, em Curvelo (Minas Gerais), mas logo se mudou para o Rio de Janeiro, onde viveu até a sua morte em 1980.

Ele foi o primeiro grande estilista de moda brasileira e desenhava as suas garotas com penteados, roupas e atitudes que eram imitadas por quase todas as mulheres na década de 50. As suas roupas tinham saia rodada, babados, cintura marcada que era o estilo típico dos anos 50 e que também lembravam as vestimentas usadas pelas atrizes americanas nos filmes de Hollywood e também por Carmem Miranda.

 

clip_image004

Revista O Cruzeiro – Capa Carmem Miranda

Penna se inspirou nos filmes de Barbarella e de Theda Bara para compor alguns de seus desenhos de moda.

clip_image006

Filme Barbarella – 1968 (Jane Fonda)

Além do estilo anos 50 em seus figurinos ele também usava muitos decotes, recortes, peles nuas, abertas ao sol, no eterno jogo de mostrar e esconder.

Os seus desfiles para a multinacional francesa Rhodia no Brasil tinham muito de brasilidade, com muitas cores. O estilista era conectado com a contra cultura e outros movimentos de vanguarda, como a Pop Art.

 

clip_image008

Vestido de Alceu Penna para a coleção da empresa

Rhodia no Brasil (1959)

Penna desenvolvia seus desenhos influenciados pela arte de seu País e escrevia em sua coluna: “As Garotas do Alceu”, para a revista semanal O Cruzeiro.

A revista circulou durante 37 anos ininterruptamente e transformou-o num dos nomes mais conhecidos da imprensa brasileira. O último número publicado foi em maio de 1975 e depois com o novo dono, encerrou no ano de 1980, quando parou de circular definitivamente.

Na época, as mulheres copiavam os seus modelos, porque ele tinha a capacidade de informar ao leitor em poucas palavras e pelo seu desenho, qual o tipo de tecido usado pelas “Garotas do Alceu”.

clip_image010

As Garotas de Alceu, na revista O Cruzeiro

As costureiras do Brasil compravam a revista, copiavam e depois costuravam os modelos das suas roupas para as suas clientes.

Penna faleceu quando a obra “O Menino Maluquinho”, de Ziraldo, foi publicada pelo cartunista, que o admirava muito.

A importância dos trabalhos de Alceu Penna se justifica porque o estilista é o um ícone dos anos 40 e 50 no Brasil que influenciou duas gerações de brasileiras, com seu estilo moderno de escrever sobre moda, comportamento e cultura.

Este cartunista, estilista e ilustrador tem sua importância na memória nacional por desenhar e inventar a mulher brasileira de sua época.

 

clip_image012

Alceu Penna

Segundo Ziraldo, ele conseguiu interferir na vida e nos hábitos das pessoas deste País, antes do advento da televisão no Brasil.

Penna também escrevia artigos para a revista A Cigarra, dirigidos para o seu público-alvo, a mulher brasileira, jovial, moderna e independente.

O estilista mineiro desenhou muitos figurinos para espetáculos teatrais, bailes de carnaval, concursos de beleza, vestidos de noivas e moda praia.

http://faroartesepsicologia.blogspot.com/2012/01/o-estilista-alceu-penna-o-descobridor.html

Estilistas mineiros levam coleção às ruas

Por Paulo Peixoto
Jornalista da Agência Folha, Belo Horizonte

Desfile coletivo inspirado nas “Garotas do Alceu” no Minas Cult / 2005 – Com desfiles, exposições, performances, shows e debates, Festival Minas Cult ocupa espaços públicos de Belo Horizonte

O setor da moda de Minas Gerais decidiu reagir, ocupando ruas e espaços públicos de Belo Horizonte. Foi aberto anteontem à noite na praça da Liberdade (região central) o Festival Minas Cult, um movimento inédito e gratuito que, até 8 de maio, pretende mostrar à população a parceria de cerca de 30 estilistas e designers de moda mineiros com a arte, música, literatura e religião como inspiração de suas criações.
Desfiles, exposições, performances, shows e debates integram o festival, que, além de mostrar a interatividade da moda mineira com as variadas expressões culturais, pretende ser um movimento de resgate do tradicional mercado mineiro da moda, esquecido a partir do início dos anos 90, com os grandes eventos no Rio e São Paulo.
Na abertura dos desfiles, que vão durar cinco dias, o estilista Ronaldo Fraga mostrou sua última coleção inspirada na obra de Carlos Drummond de Andrade, com figurinos e cenário reproduzindo a poesia do poeta itabirano. A Patachou expôs uma passarela criada exclusivamente para ela por Amilcar de Castro (1920-2002), que hoje integra o acervo do artista plástico mineiro.
Renato Loureiro -que em uma tenda de 2.600 m2, armada na praça da Estação- vai apresentar suas coleções inspiradas no artesanato e no barroco mineiro. Ele disse que esse movimento estava reprimido há algum tempo e que busca não só despertar o setor da moda de Minas e chamar a atenção do país para esse pólo de produção mas também aproximar da moda o mundo da arte.
“Tem muita gente boa que está fora disso. São poucos estilistas e algumas marcas presentes em São Paulo. A maioria está fora”, disse. O estilista afirmou que “vale tudo” para despertar as pessoas para esse movimento, como bandas e a reedição pela Vide Bula de 63 camisetas expostas na praça da Liberdade com a foto de George W. Bush com nariz de palhaço, sobre a frase “The word is not a joke!” (o mundo não é uma piada!).
O Minas Cult é um desejo antigo do Grupo Mineiro de Moda e de empresários do ramo. Assina a produção executiva o empresário Paulo Borges, criador da São Paulo Fashion Week. “Passamos 15 meses discutindo o que fazer, coisas que fossem fiéis às coisas de Minas. Mas não é só moda, é o viés da moda para falar de design, arte e cultura como comportamento.”

“Garotas do Alceu”
A cada ano, o festival quer homenagear uma personalidade da moda. O primeiro Minas Cult presta homenagem ao ilustrador mineiro Alceu Penna (1915-80), que, durante anos, mostrou suas ilustrações de moda nas páginas da extinta revista “O Cruzeiro” com o nome “As Garotas do Alceu”. Inspirado nos figurinos dele, alguns estilistas criaram novos modelos, adaptados aos olhares de hoje, e vão apresentá-los amanhã na praça da Estação.
Trabalhos de Alceu Penna ficarão expostos no MAP (Museu de Arte da Pampulha), que, como a Casa do Baile -obras da primeira fase do trabalho do arquiteto Oscar Niemeyer- e o Museu de Artes e Ofícios, também serão locais onde os estilistas vão se misturar a músicos e artistas para mostrar e falar sobre comportamento, idéias e economia.

Publicação: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1504200523.htm


Como destaque na programação do primeiro Minas Cult no ano 2005, o desfile coletivo com inspiração nas “Garotas do Alceu”, vinte e cinco grifes e estilistas mineiros recriaram no espaço contemporâneo peças baseadas no trabalho do artista: Alphorria, Art Man, Brasilianas, Bárbara Bela, Claudia Mourao, Condotti, Drosófila, Eduardo Suppes, Eliana Queiroz, GL – Giselle Loyola e Luis Claudio, Graça Ottoni, Joaquim Nogueira, Liana Fernandes, Mabel Magalhães, Manoel Bernardes, Marcos Ferreira, Martielo Toledo, Patachou por Tereza Santos, Printing, Renato Loureiro, Sheila e Érika Mares Guia, Sonia Pinto, Terezinha Geo – Talento, Victor Dzenk e Vide Bula desfilaram mais de 30 looks com referências ao trabalho do famoso desenhista ao som de uma orquestra ao vivo, que tocou músicas de época.

Publicação: http://www.institutoinmod.org.br/desfile-as-garotas-do-alceu/

Alceu Penna segundo Ziraldo

Por Ziraldo Alves Pinto
Escritor, cartunista, ilustrador.

Publicado no Catálogo da Exposição “As Garotas do Alceu” (Palácio das Artes/Belo Horizonte, MG/Julho 1983) 

“De las dos almas en el mundo que habia unido Diós, dos almas que se amaban, esto” éramos um de nós e uma Garota do Alceu.
Nós éramos os namorados das Garotas do Alceu. Nós as tínhamos “under our skins”.
Nós amávamos as Garotas do Alceu.
Durante anos, todas as moças bonitas deste País – dos fins da tarde nas calçadas da Praia de Icaraí, em Niterói, e das filas do Cine Metro, no Rio, aos “footings” das pracinhas do interior – se penteavam, se sentavam, gesticulavam, sorriam e se vestiam como as Garotas do Alceu.
E nos encantavam e nos faziam sonhar. Tanto que, muitos de nós – quase todos os que se casaram naquela época – nos tornamos, um pouco, genros do Alceu.
Nós conversávamos nos bancos das praças, passeávamos pelas calcadas, beijávamos no cinema e dançávamos nas nossas festinhas, ao som da nossa canção. E depois, ganhávamos de presente um caderno com todas as letras das músicas de sucesso, com a nossa canção abrindo a coleção, fosse ela um bolero de Gregório Barrios ou um “fox” de Nat King Cole.


E cada letra vinha enfeitada com a figura de uma das mocinhas cheias de graça que Alceu Penna (1915-1980) publicava, todas as semanas, nas páginas da revista O Cruzeiro.
A equipe de jornalistas, repórteres, ilustradores e humoristas do Cruzeiro criaram vários mitos naqueles tempos – que não vão muito longe. Não tenho, porém, conhecimento, na história de nossa imprensa, de nenhum outro artista que tenha influenciado, com seu trabalho, o comportamento de toda uma geração (talvez só o Pasquim, com seu conjunto de colaboradores, tenha conseguido isto, alguns anos mais tarde).
Sei – por informações e pesquisas – da importância de J. Carlos para sua época, com seus almofadinhas e suas melindrosas; conheci o trabalho de Péricles, com o seu Amigo da Onça, mas estou seguro de que, nem um nem outro, conseguiu com seu desenho agir sobre o modo de ser do brasileiro, determinar maneiras de comportamento, de sentir, de escolher, de vestir.
Em suma: criar uma moda brasileira.
Fazer o que a televisão faz hoje, em escala cósmica, era um trabalho quase impossível para um desenhista só, mesmo numa revista que, à época, significava para o Brasil o que a TV Globo, por exemplo, significa nos tempos de agora. Mesmo porque, a mensagem impressa não tem nem a velocidade nem o impacto da mensagem eletrônica. O que aumenta os méritos da obra de Alceu Penna como ilustrador e figurinista.
Suas meninas de olhos expressivos, de gestos delicados e cheios de graça, de cinturas finas, de longos cabelos e de saias rodadas, cujo tecido era informado com duas ou três pinceladas – a gente sabia se era seda ou algodão – eram tão fortes que, me parece, os leitores conviviam com elas como se convive com um ser vivo: ninguém fica perguntando quem é o pai da criança.
Elas tinham vida própria, e tanta que Alceu desaparecia por trás delas. De resto, Alceu Penna era um homem calmo e retraído, doce e sereno, doméstico, não gostava de aparecer. E, muito cedo, tão logo o sucesso da revista O Cruzeiro começou a se esvanecer, ele foi sendo esquecido.
Uma injustiça que não se pode atribuir a ninguém. Há coisas que acontecem na vida e, com todos os dados ao nosso alcance para explicá-las, corremos o risco de chegar a uma falsa dedução. Simplesmente: aconteceu assim.
Alceu me encantava. Seu trabalho, sua técnica, sua sofisticação, a incrível facilidade com que ele desenhava, me encantavam.
Aqui está a primeira exposição de seu trabalho, depois de sua morte. Acredito que seja a primeira exposição dos trabalhos desde que ele começou (não me lembro de outra – eu disse – ele era retraído e desenhava como quem respira: por pura necessidade vital). Dava-nos sempre a impressão de que o que fazia não era muito importante, nem para ele nem para ninguém.
Puro jeito de ser. Ele, no fundo, sabia que era um grande artista, um dos maiores de toda a História da imprensa brasileira.
Acho urgente que esta sua exposição percorra o Brasil inteiro. Nada disso de querer que sua memória seja reverenciada. Ele iria achar de extremo mau gosto, não é por aí. O que importa é que os primeiros netinhos das Garotas do Alceu conheçam o desenho do moço que ensinou vovó a ser a adolescente mais doce deste século.

 

Alceu de Paula Penna, um pouco de sua história e das Garotas imortais na sua última entrevista a ”O Cruzeiro”

Por A. Accioly Netto 

Jornalista, Diretor da Revista “O Cruzeiro”, RJ

(Matéria publicada na revista O Cruzeiro- Edição 12/ paginas 100 -105/ 15 de fevereiro de 1980)

Editora: Jeanette Hansen / Desenhos e Foto: Arquivo/OC

As “Garotas” de Alceu acabam de completar quarenta anos de existência. Essa informação para as jeunnes filles en fleur, ou seja, a “geração pão e cocada” dos atuais cronistas mundanos pouco ou nada significa. Mas para suas mães que foram moças na década de 50, a constatação é melancólica, pois aquelas figurinhas bonitas, elegantes e ingênuas, mas sutilmente maliciosas, além da diversão semanal favorita dos leitores da revista O CRUZEIRO, eram modelos de figurinos, penteados e inspiração para trabalhos de artesanato. O mesmo havia acontecido com suas avós em eras anteriores com as “Melindrosas” de J. Carlos. Depois da aposentadoria voluntária de suas “Garotas”, Alceu de Paula Penna recolheu-se a uma vacância otimista, onde passava o tempo ouvindo música, lendo bons autores modernos, e recordando de quando em vez as suas “filhas”.

O repórter, seu amigo de todas as horas, foi entrevistá-lo para comemorar a data, e o fez em ambiente tranqüilo e descontraído. O artigo não chegou a sair com Alceu em vida, porque em 13 de janeiro, pouco depois de completar 65 anos, falecia serenamente, após a comemoração de seu aniversário, realizado no dia primeiro desta década de 80. São suas últimas palavras, de grande artista e incomparável figura humana, que reproduzimos e se ele não mais as lerá, vão servir para recordar sua passagem entre nós, toda ela dedicada às belas artes.

É uma homenagem de o CRUZEIRO ao seu grande colaborador.

A SAGA DAS GAROTAS 

Alceu de Paula Penna, filho de fazendeiros, pai Christiano Penna e mãe Mercedes de Paula Penna, natural de Curvelo, pacata cidadezinha situada no centro geográfico de Minas Gerais (onde nasceram ambém o romancista Lúcio Cardoso, o político Adauto Lúcio Cardoso e a figurinista Zuzu Angel), contando dez irmãos e irmãs. Nos idos de 1932 veio para o Rio de Janeiro estudar arquitetura –“Matriculei-me na Escola Nacional de Belas Artes e segui os cursos até a quinta série mas, na verdade, gostava mesmo era de desenhar. Durante cinco anos fiz histórias em quadrinhos na Rio Gráfica Editora, com textos de Nelson Rodrigues ilustrava contos e novelas e produzia capas para a Empresa Gráfica O Cruzeiro, colaborando também para os suplementos feminino e a infantil de O Jornal com Elza Marzulo.”

 

Um certo dia 5 de abril de 1938 os jornais cariocas publicaram o seguinte anúncio: “As Garotas que têm yumpf. As Garotas que são a expressão da vida moderna. As Garotas endiabradas e irrequietas serão apresentadas todas as semanas em O CRUZEIRO, por Alceu, o mais malicioso e jovem de nossos artistas. As Garotas em duas páginas a cores constituem um dos its de O CRUZEIRO, a revista que acompanha o ritmo da vida moderna”.

Na data seguinte, inseridas numa publicação de enorme prestígio cuja tiragem, na época, era maior que todas as outras revistas somadas, surgiam as “Garotas de Alceu”. Desenhadas com graça e elegância, com legendas de muito bom humor, abordavam os mais variados temas mundanos, cinematográficos,  esportivos, políticos, teatrais foram desde logo adotadas como uma espécie de biblia, pelos muitos milhares de leitores e leitoras, durante nada menos de vinte e oito* anos de publicação ininterrupta.

As moças eram suas fãs incondicionais utilizando os desenhos para um sem número de utilidades, principalmente como modelos de vestidos e penteados. Muitas encadernavam as páginas, outras copiavam os desenhos para trabalhos manuais nos colégios e artesanato de couro, madeira, cobre, porcelana e bordados de blusas, vestidos, etc. Suas frases e pensamentos eram repetidos, criando-se modismos populares. Há quem diga que serviram de exemplos para duas gerações de adolescentes. As “Garotas” tiveram quatro legendistas: Accioly Netto (Lyto) Millor Fernandes (Vão Gogo) Edgard de Alencar (Aladino) e Maria Luiza Castelo Branco. Foram também programas de sucesso na Rádio Tupi, protagonizada por Lourdinha Bittencourt, Salomé Cotelli, Solange França e Nilza Magrassi, ensaiadas por Paulo Gracindo, com patrocínio do Jockey Club Brasileiro.

Mas, como dissse Aristóteles, o filósofo, “tudo o que nasce começa a morrer”, e em 1964 desapareceram das páginas de O CRUZEIRO quando a revista estava em plena decadência. Mas por que, exatamente?

-“Saíram de moda, sendo substituídas por outras em carne e osso, menos ingênuas, dançarinas calistênicas de discotecas, com tendências ao nudismo, nas praias e bailes de carnaval, em biquínis microscópicos. Além do mais usavam uma gíria incompatível com a índole das minhas garotas, bem mais cultas e inteligentes.”

Na imprensa mundial o mesmo aconteceu. No princípio do século eram as “Gibson’s Girls” no Saturday Evening Post, frias e discretas, embora belíssimas, depois surgiram as “Petty’s Girls” do Squire, e em seguida as “Vargas’s Girls”, mais medíocres, do Playboy. Daí por diante os desenhos acabaram para dar lugar às máquinas fotográficas, focalizando as “coelhinhas” e “moças de calendário”, que começaram usando o “manto diáfano da fantasia”, segundo a definição de Eça de Queiroz, para atingirem rapidamente o nu frontal, com todas as suas cruas implicações sexuais. E o mesmo está acontecendo com nossas publicações ditas “só para homens”, embora mais comedidas e discretas, sob o olho da censura – de Status a Lui, passando por Ele e Ela, Homem e Playboy- vendidas nas bancas de jornais envoltas em mantos hipócritas de celofane.

*N. do E.: 26 anos exatamente.

DEPOIS DA MEIA NOITE 

Mas nem só de “Garotas” viveu Alceu Penna, grande figurinista, que em breve foi convidado a trabalhar com os “reis das noites”

-“Antes de terminar o jogo, por obra e graça do Presidente Dutra, praticamente desenhei os figurinos de todos os shows do Cassino da Urca, dirigidos por Chianca de Garcia, como: C’a cest Paris com Rey Ventura, até Vem, a Bahia te espera, ao mesmo tempo que atendia ao Golden Room, do Copacabana Palace Hotel, onde imperava, gastando milhões, a suntuosidade do barão Von Stukart, como Carrousel, cujos vestidos eram bordados com pedrarias semipreciosas. Atendi também o irrequieto Lanthos, do Cassino Icarai, bem mais modesto em seus espetáculos. Depois que roletas foram recolhidas  fiz vários shows com o imaginoso Silveira Sampaio, que encenou na boate Beguin Quem Roubou meu Samba? , No País dos Cadillacs e Brasil de Pedro a Pedro, todos de imenso êxito. Fiz ainda com Chianca de Garcia, Circo, no Teatro Carlos Gomes, para Abelardo Figueiredo, Circus, no Canecão, e para Accioly Netto, Frenesi no Golden Room do Copacabana Palace, modelos executados por Evandro de Castro Lima.”

Nos carnavais, Alceu Penna decorou durante oito anos os Bailes dos Artistas do Hotel Glória. Manteve ainda em O CRUZEIRO duas páginas de modas durante alguns anos, e vários Calendários.

Nos concursos de beleza dos Diários Associados, desenhou numerosas fantasias como a “Cearense” de Emilia Corrêa Lima, que foi Miss Brasil, e a “Baiana” de Martha Rocha, igualmente vitoriosa, e quase Miss Universo em Miami.

-“Por falar em baianas, estando em Nova York para a Feira Internacional renovei todo o guarda-roupa de Carmem Miranda, que então atuava no Broadhust Theatre, com Abott & Costelo e Jean Sablon – primeiro como atração e depois como estrela absoluta do empresário Shubert-inclusive as saias multicoloridas, os turbantes fantásticos e os sapatões de solas grossas. Desenhei também as suas fantasias quando foi para Hollywood com o Bando da Lua. No teatro declamado, forneci modelos de roupas para Isto deve ser proibido, de Cacilda Becker e Walmor Chagas, como também Sleuth de Paulo Gracindo e Gracindo Júnior.”

A FASE INTERNACIONAL

Foi naquela época que a Companhia Rhodia, por intermédio do inventivo e dinâmico Livio Rangan italo-paulista de muito talento e bom gosto, lançou os seus grandes desfiles e shows internacionais de modas, com tanta repercussão e sucesso, todos com modelos exclusivos de Alceu Penna.

Começou com a Coleção Café cujas padronagens eram desenhadas por vários pintores brasileiros de renome com desfiles em Paris (Maison de l’Amerique Latine) e Hamburgo (Hotel Atlantic) vestidos pelos famosos manequins Mila, Lucia Curia e Marucia Carnowska. Outro desfile, o Brazilian Look, esteve em New York, Chicago e Filadélfia, com cerca de quarenta criações originais.

-“Na Rhodia tive uma fase sumamente gratificante, trabalhando com uma equipe numerosa e atendido por fartos recursos financeiros. Depois dos desfiles, a criatividade de Livio Rangan expandiu-se para os shows de modas, com a presença de manequins famosos, que passavam os vestidos, artistas e cantores como apoio. Foram eles, Stravaganza, Brazilian Primitive, Momento 68, Festival do Couro e Rio 400 anos, apresentados com Gal Costa, Raul Cortez, Rita Lee, Eliana Pitman, Gilberto Gil e Caetano Veloso. Nestas temporadas lancei mais de duzentos modelos. Os shows estiveram na Europa, Asia, América do Norte – especificamente, Roma, Paris, Hong Kong Libano – percorrendo depois, quase todas as capitais brasileiras em espetáculos de beneficência. A seguir, com a Ducal outros shows do mesmo gênero foram apresentados contando com Jô Soares, Wanderléa e Eliana Pitman. Foram promotores jornalisticos as revistas O CRUZEIRO e depois Manchete.”

…….……….

Embora aposentadas por Alceu, por bons e leais serviços, as “Garotas” continuam como marcas registradas do bom gosto juvenil. Vinicius de Morais, para quem “a beleza é fundamental” (com desculpa das feias…) compôs com Tom Jobim, o capolavoro da Bossa Nova, “Garota de Ipanema”, que finalmente deu nome a uma bela praça carioca. Por tudo isso, e muito mais, também o nome de Alceu de Paula Penna jamais será esquecido, como um dos maiores desenhistas do Brasil, não só na história de nossa arte como na memória daqueles que tiveram o privilégio de conhecê-lo vivo e atuante, principalmente na revista O CRUZEIRO, que o viu nascer com suas criações e onde teve seus momentos de glória.

E a cidade do Rio de Janeiro, assim como fez com a “Garota de Ipanema deverá de ora em diante dar o seu nome a uma de  suas vias públicas RUA ALCEU DE  PAULA PENNA. E com isso fará um ato de justiça a quem levou a existência glorificando as suas adolescentes em flor.

Alceu Penna, o figurinista de São João

 Por Nelson Cadena

Pesquisador e jornalista

Publicado no Correio da Bahia (21/07/2017)

 “É claro que o artista influenciou a mídia específica e vários concorrentes tentaram impor estilos da então denominada moda caipira, numa referência à forte tradição das festas juninas no interior do Brasil, em especial no Nordeste. Nenhum obteve sucesso. Ao contrário, Penna continua atualíssimo. Basta olhar as suas sugestões de vestidos, sapatos e botas, chapéus, blusas de época, para garotas; são as mesmas que vemos hoje nas vitrines das lojas de shoppings nessa época do ano. Alceu interpretou, como nenhum outro desenhista de seu tempo, o espírito junino que traduziu em estampas associadas os elementos característicos: fogueiras, balões, sortes, milho, bandeirolas…” Nelson Cadena em “Alceu Penna, o figurinista de São João”, Correio da Bahia.Leia na íntegra:Nelson Cadena:

Alceu Penna, o figurinista de São João

 Pode ser exagero, mas me sinto confortável, nesse excesso verbal, reconhecer que a moda das festas juninas tem um pai e quem encarna esse papel de figurinista é Alceu Penna, jornalista, figurinista, designer de embalagens e ilustrador nascido em Minas Gerais e que durante mais de 40 anos brindou os brasileiros com desenhos publicados nas revistas A Cigarra e, em especial, O Cruzeiro, a semanal de maior circulação no Brasil entre as décadas de 1930 e 1960. Abrindo e fechando um parênteses, há quem reconheça como de sua inspiração a baiana estilizada do figurino de Carmem Miranda, símbolo da brasilidade na terra do Tio Sam.

Ninguém neste país influenciou tanto a moda das festas juninas quanto o jornalista aqui referido. Através de centenas de modelitos criados por ele e divulgados em páginas duplas da revista, ano após ano, nas edições de junho, quase sempre com comentários em texto,  Penna influenciou tanto a elite e a classe média brasileira que lia revistas e participava das festas de São João nos clubes sociais, que as grandes fabricantes de tecidos lançaram no mercado similares dos seus desenhos. O mineiro, já consagrado ilustrador, acabou sendo mais tarde consultor e figura exponencial dos famosos desfiles da Rhodia.

 Todas as mulheres brasileiras queriam ficar lindas e sensuais (o lápis do ilustrador imprimia essa forte característica) com os vestidos, inicialmente de chita, desenhados por Alceu, que, além de originais nessa temática, abusavam das cores e esse era um de seus triunfos. Outros desenhistas de moda da época, tipo Raquel, na revista O Cruzeiro, e Marinete, na Revista da Semana, seguiam a tendência das estações, ou no máximo incursionavam na moda temática de fantasias de Carnaval, na qual Alceu Penna também foi um exímio criador. Também de maneira brasileiríssima, fugindo do estereótipo de árabes, sheiks, ciganos, piratas, marinheiros, etc.

É claro que o artista influenciou a mídia específica e vários concorrentes tentaram impor estilos da então denominada moda caipira, numa referência à forte tradição das festas juninas no interior do Brasil, em especial no Nordeste. Nenhum obteve sucesso. Ao contrário, Penna continua atualíssimo. Basta olhar as suas sugestões de vestidos, sapatos e botas, chapéus, blusas de época, para garotas; são as mesmas que vemos hoje nas vitrines das lojas de shoppings nessa época do ano. Alceu interpretou, como nenhum outro desenhista de seu tempo, o espírito junino que traduziu em estampas associadas os elementos característicos: fogueiras, balões, sortes, milho, bandeirolas…

 Na sua estreia, em 1939, na seção “Garotas” de São João, criou figurinos com foco no vermelho. Mais tarde, início da década de 50, lançou os vestidos ajustados com babados e mangas fofas, propondo  o algodão como matéria-prima. Nos reporta a figurinos característicos de algumas quadrilhas de nossa região. Na década de 60, Alceu inovou com as estampas de fogos acesos, cores de milho, bandeirolas e as combinações com retalhos que acabaram se popularizando anos depois para além do simples uso no vestuário de época. É nessa década que o figurinista passa a desenhar camisas e calças masculinas para as festas juninas e também a confeccionar as peças, vestindo modelos com elas para apresentá-las em fotografia.

Alceu Penna também escrevia, mas nos textos que ilustravam moda servia-se de dois grandes parceiros: Aladino e Maria Luíza. Esta última, num comentário sobre a moda junina, escreveu: “As garotas depois de muito pensar nos defeitos dos homens descobrem que eles só têm um defeito grave: achar que elas têm defeitos”. Uma frase bobinha, mas com algum sentido para os anos 60.

Fonte: Nelson Cadena: Alceu Penna, o figurinista de São João

 

Google lança exposições on-line com acervo histórico de moda

Por Daniela Pessoa

Jornalista

Publicado na Revista Veja-Rio (10/06/2017)

Plataforma reúne 20 000 imagens de roupas e acessórios que contam a história da moda no Brasil e no mundo, de Salvatore Ferragamo a Carmen Miranda

Apreciar os maiores tesouros da humanidade nunca foi tão simples e, principalmente, barato. Separados por milhares de quilômetros, os acervos de templos da cultura como o Musée d’Orsay, em Paris, e o MoMA, em Nova York, hoje ficam a apenas alguns cliques de mouse de distância um do outro. Em um projeto que já dura seis anos, o Google vem digitalizando a herança cultural do planeta e disponibilizando todo o conteúdo gratuitamente na plataforma Arts & Culture. Ali estão imagens de obras e artefatos de museus, galerias e institutos culturais em mais de setenta países. Na quinta (8), o site ganhou um novo e importante departamento, voltado exclusivamente para a moda.

Cerca de 20 000 peças de mais de 170 instituições podem ser apreciadas em exposições virtuais com imagens de altíssima resolução e experiências de realidade virtual. Há criações de Karl Lagerfeld para as grifes Chanel e Fendi, modelitos da espanhola Balenciaga e os sapatos de Salvatore Ferragamo usados por Marilyn Monroe e Audrey Hepburn. Em meio a essa coleção vultosa, o Rio está muito bem representado. Galerias virtuais do Museu Carmen Miranda, do Museu da Moda Brasileira, do Museu Imperial de Petrópolis e do Instituto Moreira Salles dão o tom da carioquice e brasilidade no mundo fashion. O Museu do Índio também foi incluído, com uma curiosa mostra sobre a origem e o misticismo das miçangas. “A ideia é mostrar que até mesmo o que nós vestimos é cultura”, afirma Alessandro Germano, diretor de parcerias do Google.

Fechado para visitação há dois anos, o Museu Carmen Miranda, no Parque do Flamengo, disponibilizou cinco exposições on-line sobre o exótico vestuário da cantora. Colorido, repleto de balangandãs e encimado pelo indefectível turbante de frutas tropicais, o visual virou ícone do Brasil mundo afora em meados do século passado. Batizado como “Miranda Look”, foi inspirado nas vendedoras de quitutes que se vestiam de baiana na Praça XI, no Centro. Nos catorze filmes que rodou em Hollywood, Carmen envergou figurinos que podem ser comparados, em valor histórico, aos usados por Marlene Dietrich e Marilyn Monroe. Entre os itens imperdíveis da mostra estão a roupa usada na homenagem que recebeu na Calçada da Fama, em 1941; as do filme Copacabana (1946), que a alçou ao posto de ícone da moda, e a indumentária de seu último show, em 1955. “Nunca segui modismos. Acho que a mulher tem de vestir o que lhe cai bem. Por isso, criei meu estilo próprio”, disse, certa vez, em uma entrevista.

Para realizar as novas imagens, o Google criou uma câmera especial, capaz de registrar objetos históricos e obras de arte em gigapixel, resolução maior do que a de qualquer câmera digital. A art camera, como é chamada, é equipada com laser, para guiar o foco, sonar, que se vale de ondas de alta frequência para medir distâncias, acelerômetro, para detectar vibrações, e um sistema robótico, para se movimentar. “A máquina tira várias fotos de detalhes de uma mesma peça. Em seguida, as fotografias são costuradas pelo nosso software até formar uma única imagem com qualidade de bilhões de pixels”, explica Tomás Nora, gerente de projetos da companhia. O recurso permite apreciar o traje do imperador Pedro II, do Museu Imperial de Petrópolis, por exemplo, com um grau inédito de precisão. O mesmo vale para as imagens de Otto Stupakoff (1935-2009), precursor da fotografia de moda no Brasil, em cartaz na exposição virtual na seção destinada ao Instituto Moreira Salles.

Museólogos e gestores de instituições culturais consideram a tecnologia desenvolvida pelo Google uma ferramenta poderosa no processo de democratização do acesso à arte. “Além de divulgar os museus, os tours e as galerias virtuais acabam estimulando as pessoas a visitar as exposições físicas”, avalia Marcelo Araújo, presidente do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram). Pouco conhecido, o Museu da Moda Brasileira, que há anos está para ser inaugurado na histórica Casa da Marquesa de Santos, em São Cristóvão, oferece aos internautas uma interessante mostra on-line sobre a origem dos leques, por exemplo. O artefato inseparável das damas da corte brasileira, além de ajudar a aplacar o calor, era um importante elemento nos códigos sociais do período imperial. Com o acessório, as mulheres sinalizavam se estavam disponíveis para um flerte ou se uma conversa estava encerrada.

Igualmente curiosa, uma coleção de carnês de baile guardados nesse mesmo museu traz preciosidades como os registros do Baile da Ilha Fiscal, o último do império. Funcionavam como uma espécie de diário, onde as moças costumavam anotar o nome dos parceiros de dança em cada festa. Uma terceira exposição da casa revela a importância do ilustrador, estilista e designer Alceu Penna (1915-1980) para a moda brasileira. Seus croquis publicados em importantes revistas entre as décadas de 30 e 70 influenciaram a maneira de se vestir no país. Seus esboços estão todos lá, na internet, acessíveis por desktops, smartphones e tablets. É só clicar, navegar e curtir muito.

Google lança exposições on-line com acervo histórico de moda

CCBB Rio abre exposição “Yes! Nós Temos Biquíni”

Publicado no Jornal do Brasil (06/05/2017)

A revolução causada por umas das peças mais icônicas do vestuário feminino é o tema da exposição Yes! Nós Temos Biquíni, que o Centro Cultural Banco do Brasil Rio de Janeiro (CCBB Rio) abre no dia 15 de maio. A mostra comemora os 70 anos do traje que transformou o comportamento da mulher e acompanhou mudanças de paradigma, conquistas, libertações e liberalidades – tudo com um olhar bem brasileiro. “O biquíni revolucionou o mundo, mas o Brasil revolucionou o biquíni”, afirma a curadora Lilian Pacce.

A mostra reúne cerca de 120 obras, entre looks icônicos e históricos de moda praia, fotografias, pinturas, esculturas, vídeos, ilustrações, instalações, artefatos históricos e amplo material iconográfico. Performances, debates e um ciclo de cinema também fazem parte da programação da exposição, que ocupará o 2º andar do Centro Cultural até 10 de julho. A exposição é patrocinada pelo Banco do Brasil.               

“A moda, para além de seu propósito inicial que é vestir o corpo, sempre esteve relacionada a questões sociais, culturais, políticas e econômicas. Esta exposição traz uma diversidade, que sempre buscamos para a programação do CCBB e apresenta um diálogo entre o elemento de maior representação brasileira na moda mundial com obras de arte contemporâneas que desafiam o visitante a interpretar essas associações”, comenta o gerente-geral do CCBB Rio, Fabio Cunha.

O percurso começa com uma explicação sobre a criação do engenheiro francês Louis Réard, que ousou diminuir a calcinha de cintura alta e revelar o umbigo da mulherO percurso começa com uma explicação sobre a criação do engenheiro francês Louis Réard, que ousou diminuir a calcinha de cintura alta e revelar o umbigo da mulher

O percurso começa com uma explicação sobre a criação do engenheiro francês Louis Réard, que ousou diminuir a calcinha de cintura alta e revelar o umbigo da mulher – símbolo do vínculo e da ruptura entre duas vidas, zona erógena, centro do corpo humano e do mundo, como se percebe na obra Um.Bigo, de Lia Chaia. Réard queria que sua ideia fosse tão explosiva quanto os primeiros testes nucleares no atol de Bikini – daí surge o nome da peça. Ilustrando modas, modismo e rupturas, uma linha do tempo mostra a evolução do traje de banho, com peças originais desde o século 19 até hoje, looks que sintetizam a imagem de cada década assim como as mulheres que fizeram a fama do biquíni ao longo da história.

Na sala seguinte, o visitante descobre que historicamente, apesar de ser uma criação francesa, o crédito pela invenção do biquíni poderia caber aos índios brasileiros e sua forma de cobrir o corpo. Tangas marajoaras datadas do período pré-colombiano, cedidas pelo Museu de Arqueologia e Etnologia – USP, mostram que os trajes já eram usados por aqui muito antes do descobrimento, mas não eram percebidos como “roupa” sob o prisma da moral dos colonizadores portugueses. A sala se completa com obras de artistas nascidos em outros países, mas que escolheram o Brasil para viver, como Claudia Andujar, John Graz e Maureen Bisilliat, que representam o encantamento dos estrangeiros com nossa cultura, e também biquínis inspirados na cultura indígena.

Temas fundamentais nos dias atuais, o empoderamento feminino e questões ligadas aos padrões de beleza impostos pela sociedade fazem parte do debate proposto pela exposição. A reflexão sobre o corpo e a praia acontece na próxima sala por meio do diálogo das obras de Marcela Tiboni, Claudio Edinger e Elen Braga com criações dos estilistas Amir Slama, Isabela Frugiuele (Triya) e Adriana Degreas, além da escultura de Tiago Carneiro da Cunha. Já a relação entre moda e arte é tratada pela inspiração mútua e parcerias inusitadas – Beatriz Milhazes, Glauco Rodrigues e Jorge Fonseca para Blue Man, J. Carlos para Salinas, Gonçalo Ivo e J. Borges para Amir Slama, Maria Martins para Adriana Degreas. No centro da sala, em destaque,Stripencores, obra de Nelson Leirner de 1967 que ganha um quinto elemento criado especialmente para a mostra.

A praia como território geográfico, social e até virtual surge em cenas do dia a dia nas imagens captadas pelas lentes de Alair Gomes, Cartiê Bressão, Fernando Schlaepfer, Frâncio de Holanda, German Lorca, Julio Bittencourt, Otto Stupakoff, Pierre Verger, Rochelle Costi,  Thomaz Farkas e Willy Biondani, além de vídeo de Janaína Tschape e de escultura de Eder Santos. Como contraponto, o trabalho elaborado por nomes que ajudaram a criar a identidade da moda praia brasileira (e projetá-la mundialmente) surge em imagens icônicas: Dalma Callado em foto que alavancou sua carreira internacional nos anos 1970, feita por Luiz Tripolli, e Gisele Bündchen clicada por Jacques Dequeker no início dos anos 2000, já famosa – e ainda Antonio Guerreiro, Bob Wolfenson, Claudia Guimarães, Daniel Klajmic, Klaus Mitteldorf, Marcelo Krasilic, Miro e Vavá Ribeiro.

Mas muito antes dos editoriais de moda, era o ilustrador e figurinista Alceu Penna quem “ditava” tendências na extinta revista “O Cruzeiro” com “As Garotas do Alceu”, verdadeiras it girlsda época. A praia é vista também pelo traço das ilustrações de Carla Caffé, Filipe Jardim e Paulo von Poser. A sala traz ainda uma videoinstalação com grandes momentos da moda praia nas semanas de moda no Brasil, e uma série de manequins com biquínis e maiôs de caráter excepcional, seja pela construção, modelagem, material ou pela criatividade em si – prova de que o biquíni é a peça mais brasileira de todas.

Na última sala, o visitante é convidado a compartilhar experiências de praia, diante das obras de Cássio Vasconcellos, Katia Maciel e Leda Catunda – e da pergunta que fica: qual é a sua praia? “A força de uma peça tão pequena como o biquíni brasileiro, basicamente quatro triângulos de tecido, está diretamente ligada ao emporaderamento feminino ao longo do último século e vai muito além da praia em si. A exposição pretende mostrar essas interfaces, seu impacto nas conquistas da mulher e o lifestyle criado em torno dele”, diz a curadora Lilian Pacce, autora do livro O Biquíni Made in Brazil.

A cenografia é assinada por Pier Balestrieri, com comunicação visual de Kiko Farkas, consultoria de arte contemporânea de Sandra Tucci, coordenação geral e produção executiva da Com Tato Agência Sociocriativa.           

Fonte: http://www.jb.com.br/cultura/noticias/2017/05/06/ccbb-rio-abre-exposicao-yes-nos-temos-biquini/

Maison Dior faz 70 anos

Nota do Editor: Dior sempre foi para Alceu Penna um dos mais admirados estilistas franceses. Inúmeras vezes suas criações foram reproduzidas nos traços do mestre e comentadas com efusividade, como neste desenho de 1953. Na semana em que a grife @dior comemora 70 anos em plena atividade, a homenagem de Alceu Penna.  Publicado no Instagram/@alceu_penna_oficial (04/07/2017)


Modelo de Christian Dior, 1947

A mostra, que teve seus espaços assinados pela arquiteta Nathalie Crinière, é uma espécie de retrospectiva pelos anos da história de Christian Dior e sua marca. Lá, será possível conferir alguns modelos históricos, como o conjunto de blazer e saia que ficou famoso como o principal representante do New Look. O trabalho dos designers sucessores do criador da Maison também será prestigiado, inclusive as criações da atual diretora criativa da marca, Maria Grazia Chiuri, primeira mulher a alcançar esse cargo.

Modelo de Maria Grazia Chiuri para Dior, 2017

Registros fotográficos do estilista e de momentos importantes para a grife francesa também estão entre os itens da exposição. Imagens de Christian no ano da fundação da Dior e dos luxuosos desfiles organizados para convidadas especiais no grande salão de sua Maison na Av. Montaigne são alguns dos destaques.

Christian em 1946 | Desfile no grande salão da Av. Montaigne, em 1953

A exposição estará aberta para visitação entre o dia 5 de julho de 2017 e 7 de janeiro de 2018.

Saiba mais:

http://pt.fashionnetwork.com/news/Exposicao-comemora-os-70-anos-da-Dior,846961.html#.WV7jZmgrJhE

Exposição comemora os 70 anos da Dior

O Cassino da Urca, atual sede do IED-Rio em processo de revitalização

Instagram/@alceu_penna_oficial

Palco de tantas produções artísticas em que Alceu Penna fez trabalhos gloriosos nos anos 40, o antigo cassino fechado em 1946 vai ser restaurado.
Sede atual do Istituto Europeo di Design, IED-Rio, a segunda etapa das obras, orçadas em R$ 27 milhões, está prevista para em outubro, com a criação de um Centro de Estudos e novo Teatro. 🎭👏🏻👏🏻👏🏻  Vamos aguardar, o lugar é lindíssimo e cheio de história!

Leia mais:

POR O GLOBO

— O teatro deve ficar pronto de seis a oito meses após o início das obras e será logo aberto ao público, para a realização de peças, shows, exposições e desfiles. Em paralelo, seguiremos com a obra do laboratório de inovação, que dará aos makers (arquitetos, designers e profissionais da área criativa em geral) a possibilidade de produzir tecidos, protótipos, maquetes. A previsão de conclusão é 2019 — afirma Fabio Palma, diretor do IED, que abriga cursos de graduação e pós-graduação em campos da economia criativa, como design estratégico, moda, comunicação visual e urbanismo sustentável.

A etapa “zero” do projeto começou em junho do ano passado, quando o IED deu início à limpeza do prédio do teatro, tomado por lixo e entulho. Seis semanas e cinco caçambas grandes de caminhão de resíduos retiradas depois, o espaço, um esqueleto de tijolos aparentes, que conserva o desenho original do casarão, estava apto a receber visitas: já abrigou duas peças de teatro e vai hospedar, a partir deste sábado, a exposição “Ambientes Infláveis”, dos artistas Hugo Richard e Natali Tubenchlak.

— E, em outubro, antes do início das obras, teremos uma ópera lírica multimídia da Jocy de Oliveira aberta ao público — adianta Fabio.

 

Segundo o diretor do IED, o novo empreendimento “será o primeiro prédio sustentável tombado do Brasil” (pelo Instituto Rio Patrimônio da Humanidade): terá painéis solares, geradores eólicos, aproveitamento geotérmico — para diminuir a necessidade do uso de ar-condicionado —, além de reutilização total da água da chuva. A obra custará R$ 27 milhões.

— Fomos autorizados pelo Ministério da Cultura a captar até R$ 21 milhões pela Lei Rouanet. Apresentamos o projeto ao BNDES, e ele foi formalmente acolhido. Em julho, deveremos ter uma resposta — afirma Fabio.

Em 2006, a prefeitura cedeu ao IED por 25 anos, renováveis por mais 25, o prédio do antigo Cassino da Urca, que já abrigou o Hotel Balneário e a TV Tupi. Em 2014, após R$ 14 milhões serem investidos em revitalização, a parte do imóvel voltada para a praia foi inaugurada, com salas de aula (hoje são cerca de 600 alunos), laboratórios criativos, espaço para exposições e uma cafeteria.

— A contrapartida do IED era a reforma integral do prédio, conservação e manutenção, para transformá-lo num espaço privado e, ao mesmo tempo, público. Temos um programa de concessão de bolsas e oferecemos atividades gratuitas — observa o diretor.

Mas ainda há uma grande polêmica entre o IED e os moradores da Urca, preocupados com o impacto da atração no bairro.

 

— Fiz um projeto para desestimular o uso de carros e consegui que a prefeitura e o Itaú instalassem uma estação do Bike Rio. Para os 15% dos usuários do IED que vêm de carro, há convênio com o estacionamento da Igreja Santa Teresinha e van para traslado — assegura Fabio.

A Associação de Moradores da Urca (Amour) resiste.

— Na Urca não cabe teatro, as ruas são muito estreitas, o trânsito engarrafa facilmente. É um bairro que não aguenta esse impacto — afirma Cida Ferreira, presidente da Amour, que entrou com uma ação contra a cessão de uso do terre

Leia mais: https://oglobo.globo.com/rio/em-processo-de-revitalizacao-cassino-da-urca-renasce-aos-poucos-21378706#ixzz4lzZItiOR
stest

Em processo de revitalização, Cassino da Urca renasce aos poucos